Tenho uma história para te contar
Está difícil, deixar de falar sobre o assunto. Faz, de tal forma, parte da minha vida, que levanto-me e deito-me a pensar no mesmo. Estes "Portugueses Extraordinários"(RTP) que vou conhecendo, nem sempre são os mais visíveis. Ainda esta semana, a menina tinha apenas tamanho para ocupar uma daquelas pequeninas cadeiras de infantário, corpo franzinho e umas mãozinhas tremulas. Mas era menina para lá dos 6 anos, de voz forte e vontade de abraçar. Esse, o abraço, é sempre complicado, porque não nos queremos envolver demasiado, porque achamos sempre que a distância nos pode proteger. Não é verdade. A possibilidade desse mesmo abraço, não salva apenas quem o pede. Salva-me a mim, sempre que me estendem umas mãos desconhecidas.
A menina, chamemos-lhe Ana, assistia à entrevista a uma volutária de história dramática. Dois irmãos assassinados, uma amargura imensa, da qual se libertou quando decidiu na vida ajudar os outros. Aquela "coisa" de que a tragédia do outro pode sempre ser maior do que a minha, em mim, fez tremores. Pensei: como é possível, que dor imensa. Mas havia outra. Uma tragédia terrível ali mesmo, ao lado. A Ana, do terror dos seus pouco mais de 6 anos, puxou a minha cara, com cuidado e delicadeza de borboleta e disse: "Tenho uma história para te contar. Mas não para as câmaras." E continuou. "No outro dia, bateram-me no meu pai. Estavamos a ir para casa e apareceu um homem que o agarrou e lhe bateu muito. Fiquei muito zangada e quis ir ter com o meu pai, mas as vizinhas agarraram-me e não me deixaram. Gritei e bati com os braços e com as pernas, mas elas seguraram-me. Ele bateu no meu pai e eu fiquei tão triste." Uma menina, de pouco mais de 6 anos, procurava defender o pai, toxicodependente.
Só pude oferecer o meu colo.
Esta, é uma história que não vai aparecer na televisão.
http://tv1.rtp.pt/programas-rtp/index.php?p_id=28078&e_id&c_id=1&dif=tv