É provável que ao longo de toda a nossa vida o desafio seja o mesmo: conseguir dizer o que realmente pensamos, o que realmente sentimos. Na verdade, trata-se apenas disto: com as palavras superar as próprias palavras, nas suas limitações gráficas, sintáticas e tristes que mal as colocamos no papel nos travam naturamente o tudo que queríamos dizer.
Nunca conseguirei dizer «amo-te» ou «quero-te» como realmente o sinto. Nunca. Ao princípio não é nunca o verbo, é um mistério qualquer a que por conveniência chamamos alma. E que depois, com sorte ou talento, tenta-se chegar o mais próximo possivel ao que as palavras e as suas fronteiras querem dizer.
É por isso que gosto de polaroides. Como as palavras, elas apenas reflectem instantes eternos, muitas vezes profundos, outras fúteis - mas sempre verdadeiros. Não vejo maior ambição do que essa e é isso que tento fazer sempre que escrevo, mesmo qundo isso se limita ao que chamamos ganhar a vida.
«Todas as palavras me incomodam», dizia Cioran, que apesar de não ser o mais optimista dos seres humanos sabia que mesmo o pessimismo tem de ser escrito. Também a mim, porque sei que a pureza - e toda mas toda a liberdade - reside apenas no que não se diz. No silêncio. Tudo tende para lá e o desafio - outra vez - é fazer com que o que se escreve se vpareça o mais possivel com o silencio onde tudo se sente. Há quem consiga isso, quem tenha conseguido:«Um mover d'olhos, brando e piedoso,»: eis o exemplo de uma perfeita polaroide escrita, onde tudo se vê e as palavras tudo silenciam. Há esperança, portanto.
Voltando ao que disse, enfatizo: são as palavras que me fazem ganhar a vida. E não estou a falar de remunerações outras senão a própria vida vivida. Assim aqui me compreendam.